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Triste realidade: perdas gestacionais ainda são tratadas com frieza e silêncio

Mães relatam descaso e frases que invalidam a dor do luto perinatal e neonatal; acolhimento e protocolos ainda são raros, embora urgentes

No Interessa Podcast, mães e especialistas discutem a frieza com que a perda gestacional ainda é tratada e mostram caminhos de acolhimento e apoio emocional

Por Renata Zacaroni
Publicado em 22 de maio de 2025 | 16:50

“É como se perder um bebê, uma vida, fosse igual a perder uma carteira.” A frase dita pela jornalista Tatiana Lagôa, no Interessa Podcast desta quinta-feira (22), expõe com precisão a frieza com que a sociedade e o sistema de saúde lidam com a perda gestacional. Desde os primeiros exames, mulheres ouvem que o risco de perder o bebê nos três primeiros meses é alto, mas o alerta vem sem preparo emocional, empatia ou espaço para o luto, se lamentavelmente ocorrer. Quem já ou por isso relata que o atendimento muitas vezes é técnico, sem acolhimento.  A curetagem, por exemplo, procedimento para retirada de restos ovulares do útero, "é tratada como se fosse a extração de uma unha encravada". 

Mesmo dentro de hospitais, o luto perinatal e neonatal ainda é mal assistido. Falta protocolo, falta preparo, falta escuta. Muitas vezes, o que se ouve após a perda são frases como “Deus quis assim”, “Poderia ter sido pior” ou “Ainda bem que você nem criou vínculo”. Tentam consolar, mas o efeito é o oposto: invalidam uma dor que é devastadora, profunda e complexa. Em muitos casos, esse silêncio forçado e a negação da dor agravam quadros de estresse pós-traumático, especialmente quando a perda ocorre no primeiro trimestre, justamente o período em que se recomenda não contar a ninguém sobre a gestação.

Para romper esse ciclo de silêncio, algumas redes de apoio têm surgido. Um exemplo é o Grupo Colcha, coordenado pela psicóloga Daniela Bittar, pela médica obstetra Mônica Nardy e pela fotógrafa Paula Beltrão. O espaço funciona como uma comunidade de acolhimento para famílias que vivenciaram a perda gestacional ou neonatal. Lá se fala de despedidas respeitosas, do cuidado com o corpo e com a alma da mulher, e também da importância do registro: fotografar o bebê para criar memórias, rituais que ajudem no processo de luto.