O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a decidir nesta terça-feira (9) se confirma ou não decisão da ministra Rosa Weber que suspendeu o pagamento das emendas de relator. O julgamento tem previsão de durar um dia e pode terminar na quarta-feira (10).

O assunto voltou à tona com a análise da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios. Na tentativa de consolidar uma manobra para furar o teto de gastos públicos e pagar o Auxílio Brasil com o valor de R$ 400, a oposição acusa o governo de usar as emendas de relator como um instrumento de negociação para aumentar a base de apoio no Congresso Nacional e, assim, reduzir possíveis dificuldades políticas. 

Chamadas por técnicos de RP-9, as emendas de relator acontecem quando o relator-geral do Orçamento inclui na proposta orçamentária trechos que influenciam a alocação de recursos, sejam eles para acrescentar, suprimir ou modificar o texto original feito pelo Ministério da Economia. Os valores são acordados com deputados e senadores e convertidos em ações nos estados em áreas de atuação pública. 

Em 2020, o governo federal destinou R$ 20,1 bilhões para as emendas de relator. Nesse ano, R$ 18,5 bilhões foram reservados nos cofres públicos para esse fim. A modalidade não é única dentro do debate – existem ainda emendas impostas por bancadas estaduais, de maneira individual por cada parlamentar e as setoriais, indicadas pelas comissões temáticas do Congresso, que aumentam as cifras bilionárias do Orçamento. 

Diferente dos outros modelos, as emendas de relator não são impositivas, ou seja, não têm pagamento obrigatório, enquanto nas individuais há a garantia de pagamento do mesmo valor para parlamentares tanto governistas quanto da oposição. Nas de relator, como o processo não é automático, é necessária a concordância do Poder Executivo para que o pagamento seja feito. 

A maior polêmica que abraça isso é a falta de transparência, o que fez com que as liberações ficassem conhecidas como “orçamento secreto” ou “paralelo”. Os rees são publicados no Diário Oficial da União e trazem informações sobre o destino dos recursos, mas não há publicidade sobre os critérios utilizados nas definições e nem o nome do parlamentar que fez a indicação. Antes disso, se baseiam em ofícios trocados entre gabinetes na Esplanada dos Ministérios. 

O fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, apontou que a modalidade pode ser facilmente um instrumento de barganha. “A gente não tem a menor ideia de qual critério. Por que uns [parlamentares recebem] e não outros? Por que tem uns com valores muito maior do que os outros e outros não têm valores nenhum? Ninguém sabe exatamente disso”, pontuou, afirmando que parlamentares que se comprometem a apoiar pautas governistas podem ser contemplados com valores maiores dos que atuam com posições contrárias aos interesses do governo.

“Ficou muito claro que isso estava sendo e é usado como instrumento de barganha entre o Legislativo e o Executivo e, claro, isso é uma moeda de troca. É uma forma de cooptar parlamentares para que votem de acordo como deseja o Executivo e aquela cúpula do Legislativo”, explicou. 

Para exemplificar, Gil Castello Branco mostrou um levantamento com a liberação de quase R$ 3 bilhões no mês de outubro, em meio às negociações da PEC dos Precatórios. O valor é pelo menos 30% maior do que o registrado em meses anteriores. Durante todo o ano, o total de valores empenhados (com pagamento reservado) já supera a marca de R$ 9 bilhões. 

Os dados mostram ainda um volume de rees maior do que a média normal na semana véspera da votação do primeiro turno da proposta. Entre os dias 25 e 27 de outubro, as cifras giravam de R$ 24 milhões a R$ 48 milhões. Em 28 de outubro, exatamente sete dias antes da votação, foram lançados R$ 429,3 milhões no Sistema Integrado de istração Financeira (SIAFI), usado pelo governo federal para fazer a gestão financeira. No dia seguinte, foram R$ 480,3 milhões.

Segundo o fundador do Contas Abertas, a falta de transparência nas emendas de relator é inconstitucional. “Fere completamente o critério da impessoalidade, pois você está distribuindo recursos para uns e não para outros. Fere completamente o da moralidade porque, a meu ver, você está cooptando, ou comprando, pode-se entender assim, votos de parlamentares. Fere o critério, inclusive, da publicidade, ao você distribuir bilhões sem critérios transparentes”, declarou. 

“O problema é que esse critério não tem nenhuma isonomia. E não sendo transparente, ele está ferindo outras leis, como a de o à Informação”, destacou”, acrescentou Gil Castello Branco. 

Em junho deste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou a adoção de mecanismos mais transparentes e “racionais” na distribuição desses recursos. O caso aconteceu no julgamento das contas prestadas pelo presidente Jair Bolsonaro sobre o exercício fiscal de 2020.  

“Diferentemente do que ocorre com as emendas individuais, que dispõem de procedimentos padronizados e centralizados no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), com ampla transparência de todas as fases da alocação dos recursos, verificou-se não haver uniformização de procedimentos para a distribuição ou alocação de despesas adas com recursos advindos de emendas RP-9”, observou o relator do processo, ministro Walton Alencar Rodrigues, na época. 

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