CINEMA

Filme com Ralph Fiennes é thriller político sobre os rumos da Igreja

Com estreia nesta quinta-feira, 'Conclave' se a durante uma eleição do Papa cheia de reviravoltas

Por Paulo Henrique Silva
Publicado em 23 de janeiro de 2025 | 07:00

Não se tem falado muito em “Conclave” como um dos favoritos ao Oscar deste ano. Mas não seria surpresa se o filme do diretor suíço Edward Berger, que estreia nesta quinta-feira (23) nos cinemas, ficar com a estatueta principal. É uma obra clássica, no melhor sentido da palavra, quando os ingredientes estão todos ajustados para oferecer um thriller político-religioso.

Não há nenhuma “piscadela”, um dispositivo qualquer que nos faça sair da história e pensar no artifício de cada cena ou na mão do diretor. Da sequência em que o cardeal Lawrence chega ao Vaticano, com Ralph Fiennes filmado de costas, andando apressadamente, com uma trilha sonora intrigante, o filme não quebra o ritmo, mantendo-o em “corda esticada”.

No momento seguinte em que entra no quarto do papa e o vê morto, ele já é avisado sobre desvios de conduta dos cardeais. O que era para ser uma modorrenta eleição do Sumo Pontífice, com o local transformado em fortaleza para impedir vazamentos, caminha para uma história detetivesca no estilo de Hercule Poirot, com todos no papel de suspeitos.

Há um ponto em comum com “Nada de Novo no Front”, filme anterior de Berger também indicado ao Oscar (em 2023), ao traçar brutais hierarquias do convívio social – na guerra, com soldados mortos como moscas, e na Igreja, em que fica claro os mecanismos políticos adotados, nem sempre éticos. Em “Conclave”, uma distorção que não significa falta de fé.

Essa ligação celestial está, principalmente, no papa morto, que parece antecipar vários os do próprio conclave e do futuro da Igreja – o que lhe confere certa divindade. E está ainda na cena em que Lawrence vai até a urna para deixar o seu voto no exato instante em que uma bomba explode na janela, o que faz a luz do sol entrar de uma vez, incidindo diretamente sobre o cardeal. 

Mais: essa abertura no Vaticano tem uma leitura política que sustenta a narrativa do filme, sobre a Igreja ser mais ou menos conservadora. Os grupos (e as estratégias) vão se formando em torno disso. Por todos os lados que se olha, há sempre dúvidas e senões. O próprio condutor da eleição, Lawrence, não esconde a sua fragilidade, ao revelar a perda da crença na instituição.

Com a trama baseada no livro homônimo de Robert Harris, o filme não esconde a Igreja Católica ideal, a partir de um olhar atento para as populações mais necessitadas e para as mudanças de comportamento na sociedade. A reunião dos cardeais não deixa de ser a representação do mapa-múndi socioeconômico, com as grandes forças tentando prevalecer sobre as menores.

Está aí um dos principais méritos narrativos de “Conclave”, com Berger sendo muito eficiente na forma de estabelecer esse jogo, como um thriller em que um pequeno acento para determinado lado poderá custar um trabalho de reformulação da Igreja, combalida por conta dos casos de abuso sexual – e que, por sinal, são bastante mencionados no filme.

Ao mesmo tempo em que constrói uma atmosfera claustrofóbica, com a história desenvolvida dentro do Vaticano, o longa explora ambientes amplos, em que os cardeais se transformam em peças dentro de uma estrutura secular e gigantesca. Há cenas belíssimas neste sentido, quando os votantes surgem num pátio vestidos da mesma forma e com guarda-chuvas abertos.