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EDITORIAL

Leão XIV e a doutrina social da era digital

Unir a fé à tecnologia será o diferencial entre um catolicismo em crise e uma Igreja efetivamente conectada ao cristão

Por Editorial O TEMPO
Publicado em 10 de maio de 2025 | 07:00

“A sede de inovações, que há muito tempo se apoderou das sociedades e as tem numa agitação febril, devia, tarde ou cedo, ar das regiões da política para a esfera vizinha da economia social”. Essa frase bem poderia ter sido dita nos dias atuais para retratar como a tecnologia digital e a inteligência artificial afetam o setor produtivo. Mas ela é de 1891, da encíclica “Rerum Novarum”, de Leão XIII, o pontífice que inspirou o cardeal Robert Prevost a adotar o nome Leão XIV ao se tornar o 267º papa.

A escolha sinaliza que o sucessor de Francisco está consciente de que há outros desafios além da sequência do trabalho de Bergoglio. Leão XIII foi o papa da conciliação da Igreja com o mundo moderno. Ele viu um século XIX atordoado pelas transformações promovidas pela máquina a vapor. Manufaturas trocaram grupos de dezenas de artífices na execução de cada processo por poucos operadores de maquinários em linhas de produção, cujos tempos e movimentos inspirariam a própria organização da sociedade. 

A consciência de que a Igreja não poderia alhear-se dessa transformação inspirou o papa a produzir a “Rerum Novarum” e a promover as doutrinas sociais aproximando os religiosos das dores coletivas de seus fiéis. 

Quase dois séculos depois, Leão XIV se depara com um mundo também em radical metamorfose. A inteligência artificial, segundo o FMI, afeta 40% das profissões. Trabalhadores, isoladamente, tornam-se tão ou mais produtivos que linhas de montagem completas. A riqueza se multiplica com imensa rapidez, podendo elevar o PIB global em 7% ao ano por um período de dez anos. Na mesma velocidade avolumam-se o medo e as oportunidades. 

Esse mundo mais individualista, produtivo e tecnológico gera um cidadão centrado em si, mas igualmente criativo e poderoso. Romper essa couraça egocêntrica e promover a comunhão, unindo a fé à tecnologia, é a tarefa que assumiu Leão XIV e que será a diferença entre um catolicismo em crise e uma Igreja efetivamente conectada a um novo e mais diverso cristão – e por isso mesmo potencialmente mais rico em fé e realizações.