Meira Souza

Saúde reflete qualidade das relações humanas

Quando o corpo mostra o que não nos permitimos ver

Por Dra Meira Souza
Publicado em 03 de dezembro de 2022 | 05:00

Por que você começou a usar antidepressivo? “Para não matar o meu marido.” Ninguém espera ouvir uma resposta como esta, mas foi o que recebi de uma paciente que me procurou diagnóstico de fibromialgia.

Engenheira, engravidou pouco depois dos 30 anos, quando sua filha estava com 6 meses, ela já tinha retornado ao trabalho e estava ansiosa porque a empresa onde trabalha estava fazendo um corte de funcionários e ela em hipótese nenhuma podia ser demitida. Desde o nono mês de gravidez, o marido, também engenheiro, estava desempregado.

Imersão em preocupações e tarefas

Ela assumiu todas as responsabilidades financeiras da casa e não tinha ninguém para ajudá-la com a filha à noite ou nos fins de semana.

Mesmo não trabalhando, o marido não se envolvia com as responsabilidades com a casa e nem mesmo com a filha. Ela ainda amamentava, e esse era o argumento usado por ele a noite para não se levantar quando a filha chorava. Ele também não estava muito comprometido com a procura por um novo trabalho.

Imersa em preocupações, sobrecarga de trabalho e cuidado com a filha, ela não estava muito disponível para a vida sexual, o que deixava o marido cheio de reclamações e comentários maldosos: preciso de outra mulher, você agora é só mãe.

Antidepressivo

Neste estado de tensão, ela foi à consulta ginecológica e expôs sua história. A ginecologista prescreveu um antidepressivo e completou dizendo: “para você não matar o seu marido.”

Três anos depois, essa mesma mulher, que não matou o marido, estava 15 kg mais pesada, com dores difusas pelo corpo, sensação de fadiga e dificuldade com a memória.

O marido por sua vez, havia desistido da engenharia.

Todas as despesas da casa eram responsabilidade dela, e ela se sentia muito culpada por não estar tendo tempo para a filha.

Já não tomava um antidepressivo apenas. Tomava também um ansiolítico e um medicamentos para reduzir a compulsão por doces.

Imaginando soluções

Minha cabeça viajou e eu fiquei pensando em uma solução para essa história:

Se ela tivesse conseguido uma rede de apoio para cuidar da filha e se não estivesse insegura com a vida financeira por causa da falta de parceria do marido e pudesse trabalhar com mais tranquilidade e alegria.

 Se o marido fosse bastante companheiro e comprometido com o papel de pai.

Se ela tivesse tempo para fazer ginástica, ler um bom livro, descansar, curtir a filha.

Muito medicalizada, ela não tinha forças, nem coragem de mudar sua história. Estava visivelmente infeliz e traduzindo em seu corpo muito sofrimento.

Relações saudáveis

Quando ela saiu do meu consultório, eu senti uma tristeza e impotência profunda, realmente não consigo curar todos os problemas de ninguém, era evidente a situação abusiva que ela estava vivendo e abuso não é compatível com a saúde.

Tenham cuidado, sejam conscientes e honestos sobre suas relações. Relações saudáveis são saúde para o corpo e mente. (instagram Meira Souza)