PERSEGUIÇÃO POLICIAL

'Vira, vira, vira': PM orienta colega a desviar câmera corporal antes de jovem ser morto a tiros

Militares alegam que atiraram para se defender; imagens mostram que rapaz estava desarmado


Publicado em 24 de maio de 2025 | 16:43

Um dos policiais militares envolvidos na morte de Gabriel Ferreira Messias da Silva, após uma perseguição em novembro de 2024, em São Paulo, pediu para o colega virar o corpo para que a ação não ser gravada pela câmera corporal da Polícia Militar (PM). É o que mostram as imagens do dispositivo. Os PMs envolvidos estão afastados temporariamente da corporação.

Gabriel foi abordado pelos agentes quando saía de um posto de combustível e morto na Vila Císper, na zona leste de São Paulo. Segundo os PMs, ele teria fugido e foi baleado durante a perseguição. As imagens das câmeras mostram que os primeiros disparos aconteceram quando os policiais ainda estavam dentro da viatura. 

Ainda de acordo com a versão dos PMs, eles atiraram para se defender, alegando que o jovem teria apontado uma arma para eles. Conforme essa versão, o jovem teria sacado uma arma ao se levantar, o que teria motivado o disparo.

As imagens, no entanto, mostram Gabriel pedindo ajuda e dizendo que é trabalhador. "Sou trabalhador, senhor. Para que fazer isso comigo, meu Deus? Me ajuda, por favor", diz o jovem enquanto está no chão.

Nas gravações obtidas pelo "SP1", da TV Globo, após os disparos, os PMs descem da viatura e um dos agentes questiona se a moto é roubada. Gabriel responde que não. Minutos depois, um dos policiais diz: “Vira, vira, vira”.

De acordo com a Defensoria Pública, neste momento, os agentes alteram o ângulo das câmeras. Ainda de acordo com o órgão, nenhuma arma - além das dos próprios policiais - aparece nos vídeos. As imagens mostram o sargento Ivo Florentino dos Santos chutando uma arma no chão segundos antes de ela ser localizada próxima ao corpo de Gabriel.

Ainda segundo a defensoria, as imagens não mostram nenhuma arma, além das dos próprios policiais. Elas captam apenas o sargento Ivo Florentino dos Santos chutando uma arma no chão segundos antes de ela ser localizada próxima ao corpo de Gabriel.

A Defensoria Pública alertou o Ministério Público sobre as inconsistências do caso, o que levou a promotoria a pedir o afastamento dos policias envolvidos.

"As imagens sugerem a ausência de arma nas mãos da vítima no momento do disparo, além de indícios de possível manipulação da cena, com a inserção post mortem de objeto que justificaria o uso letal da força", diz o pedido da promotoria.

"No que tange à conduta dos policiais Ailton Severo do Nascimento e Ivo Florentino, as imagens apontam participação ativa na suposta fraude processual, seja na sugestão de plantio de arma, seja no disparo efetuado de dentro da viatura em movimento - prática contrária aos protocolos operacionais da Polícia Militar", continua.

O Tribunal de Justiça de São Paulo acatou o pedido do Ministério Público e afastou os policiais. Segundo a decisão, é preciso aprofundar a investigação.

"Embora, aparentemente, tais imagens não captem o momento exato do disparo, por tudo quanto exposto até aqui, relevante o aprofundamento da sua análise via exame pericial para elucidação dos fatos, sobretudo em razão do teor do relato da testemunha no sentido de que populares teriam afirmado que Gabriel foi alvejado ainda quando estava conduzindo a sua motocicleta, sem que tivesse sacado arma de fogo contra os policiais", diz a sentença.

Gabriel trabalhava como entregador. A morte dele é investigada pelo DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) da Polícia Civil, onde a mãe atua como recepcionista.

A Secretaria da Segurança Pública informou, por nota, que a Polícia Civil investiga o caso sob sigilo e que o inquérito da Polícia Militar foi concluído e encaminhado. A pasta afirmou ainda que não compactua com desvios de conduta e que pune com rigor comportamentos excessivos. (Com Paulo Eduardo Dias e Isabela Palhares/Folhapress e G1)